Luiz Fernando Valladão Nogueira*
Penso que a sustentação oral é a materialização, em parte, de quatro pilares da Constituição Federal: o devido processo legal; a ampla defesa; o contraditório; e a indispensabilidade do advogado.
Realmente, o texto constitucional assegura que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (inc. LIV, art. 5º), sendo que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (inc. LV, art. 5º).
Isto significa que o nosso processo, como instrumento de aplicação do direito pelo Judiciário aos casos concretos, deve assegurar aos litigantes a exposição de seus argumentos fáticos e jurídicos, em todas as etapas processuais.
E, para que esta dialética se opere com maior tecnicismo, foi eleito como representante do jurisdicionado, no âmbito processual, o ADVOGADO. Por isto a mesma Constituição Federal quis assegurar que este porta-voz do cidadão seja INDISPENSÁVEL, em todas as etapas em que o Estado-Juiz estiver a se manifestar (art. 133 – “O advogado é indispensável à administração da justiça…”).
Ora,esta indispensabilidade, assegurada com status constitucional, não pode ser ignorada em qualquer etapa do processo. A
sustentação oral, ante esta realidade jurídica, deve ser facultada em todo equalquer julgamento colegiado!
A publicidade que se quer, ainda no âmbito constitucional, às decisões proferidas pelo Judiciário (art. 93, inc. IX
CF), só será real, caso a presença do advogado, inclusive com sua manifestação oral, seja garantida.
Logo, não é de estranhar-se que a Lei 8906/04 tenha assegurado ao advogado “sustentar oralmente as razões de qualquer recurso ou processo, nas sessões de julgamento, após o voto do relator, em instância judicial ou administrativa, pelo prazo de quinze minutos, salvo se prazo maior for concedido” (art. 7º, inc. IX).
É importante ressaltar que, ao contrário do que muitos defendem, essa garantia de sustentação oral em qualquer processo ou recurso não foi suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal. Na verdade, o que foi tido como inconstitucional é
o direito do advogado sustentar, depois do voto do relator. No mais, o dispositivo da Lei 8906/94 continua incólume e em plena vigência.
A ADIN 1.127/DF, julgada pelo STF, não chegou a argüir a inconstitucionalidade da possibilidade de sustentação oral em todos os processos e recursos. O pleito formulado na inicial desta ADIN, neste particular, cingiu-se à apontada
faculdade do advogado sustentar depois do voto do relator. Por isto, como é natural, o Supremo não se manifestou, em sede de controle abstrato de constitucionalidade, a respeito do direito do advogado à sustentação oral em todo processo e recurso.
Vale conferir, aliás, parte da ementa do acórdão relacionado ao processo antes mencionado, em que restou decidido que “a sustentação oral pelo advogado, após o voto do relator, afronta o devido processo legal, além de causar tumultoprocessual, vez que contraditório se estabelece entre as partes”.
Não se ignora, aqui, haver previsão no art. 554 do Código de Processo Civil, no sentido de que será facultada a sustentação oral, “se o recurso não for de embargos declaratórios ou de agravo de instrumento”.
Acontece que, a teor da Lei de Introdução ao Código Civil, a lei posterior revoga a anterior, “quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior” ou quando com ela for “incompatível” (art. 2º, § 2º). Isto
significa que a Lei 8906/94, versando sobre as prerrogativas dos advogados, revogou em parte o art. 554 CPC, na medida em que deu maior amplitude ao instituto da sustentação oral, assegurando-lhe em qualquer recurso ou processo. Vale dizer: mesmo nos embargos declaratórios e nos agravos é permitida a sustentação oral ao advogado.
Ora, não se pode falar na indispensabilidade do advogado, muito menos nas garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, sem a adoção do raciocínio que agora se está a defender. E nem vale utilizar argumentos de ordem supostamente prática, no sentido de que as pautas de julgamentos ficariam extensas ante o número exagerado de sustentações orais. É que os agravos, com as limitações impostas ao seu processamento pelo art. 522 CPC, só serão
julgados pelo colegiado, na forma de instrumento, se a situação for grave, o que recomenda, por óbvio, a intervenção oral do advogado. E, em se tratando de embargos declaratórios nos tribunais, trata-se de chance derradeira do colegiado, tendo em vistas as conhecidas limitações de acesso aos recursos especial e extraordinário, para corrigir injustiças cometidas por decisões anteriores, devendo, com maior razão, ser dada a palavra ao profissional da advocacia.
A advocacia deve ser exercida, com plenitude. Por isto foi erigida, em sede constitucional, a indispensabilidade do advogado. Esta indispensabilidade, contudo, é uma moeda com duas faces: o advogado deve exigir a sua presença, em
todas as etapas e tipos de processos; mas o advogado, de igual forma, deve se mostrar indispensável, sobretudo através de permanente qualificação e estudo, evidenciando, sempre que possível, o quanto ele é importante para a credibilidade do próprio Poder Judiciário.
* Advogado,
Procurador do Município de BH, professor de Processo Civil na faculdade de Direito da FEAD, Diretor Adjunto do IAMG,
Autor dos Livros “Recurso Especial” e “Recursos em Processo Civil” (ed. Del Rey), coautor no Livro “Advocacia nos Tribunais”.
Fonte: Jornal Estado de Minas.