Luiz Fernando Valladão – Advogado, Professor Universitário, Coordenador e Coautor do Livro “Divórcio” (ed. Del Rey).
A partir de 2010, com o advento da Emenda Constitucional 66, eliminou-se do Direito Brasileiro o instituto da separação. Isso significa que, desde então, o casal não precisa se submeter a duas etapas – separação e divórcio. Basta que o casal obtenha o divórcio, para que seja colocado fim ao casamento e à sociedade conjugal, inclusive sob o aspecto patrimonial, estando livres também, sob o aspecto jurídico e formal, para novos relacionamentos.
Esta tendência à desburocratização encontrou um ponto de impulso em 2007, com a Lei 11.441, a qual permitiu o divórcio em Cartório (sem a intervenção judicial), por meio de simples escritura fiscalizada pelo Tabelião e pelos Advogados dos interessados, desde que não existam filhos menores ou incapazes do casal.
É evidente que esta eliminação de formalidades não objetiva estimular o fim dos relacionamentos de afeto. Muito pelo contrário, acredita-se que todos, inclusive o legislador, querem que os casamentos resultem, em benefício dos cônjuges, na paz espiritual prometida. Porém, a vida é dinâmica e os valores ostentados pelas pessoas são diferentes. E, neste contexto, as rupturas conjugais são inevitáveis. É óbvio que compete aos Advogados, em contato com o casal, buscarem a reconciliação, mas, se isto não acontecer, o ideal é que este período tumultuado da vida dos cônjuges seja rápido e menos traumático possível.
Por isto mesmo a eliminação da separação e a possibilidade de divórcio desburocratizado, por meio de Cartório, em situações mais simples, significam um avanço para estas pessoas. E o mais importante: o fim da separação significou a eliminação da insuportável e irracional discussão, antes imposta pela lei, sobre a culpa dos cônjuges pelo insucesso do casamento. Sim, até pouco tempo atrás, fazia-se imprescindível que um cônjuge atribuísse ao outro a culpa pela separação, o que gerava uma infeliz e inócua “lavação de roupa suja”, circunstância que inviabilizava qualquer reconciliação ou espécie de acordo, além de traumatizar os filhos do casal. Por isto, repita-se, em boa hora entrou em vigor a Emenda Constitucional 66/2010.
Acontece que, na contramão do que motivou a referida alteração da Constituição Federal, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 5432/13, do deputado Takayama (PSC-PR). O referido parlamentar pretende, agora, reinstaurar a discussão sobre a culpa pelo fim do relacionamento, no âmbito do processo de Divórcio. E, além disto, quer que aquela simples escritura de Divórcio (para os casos de ausência de filhos menores ou incapazes) seja homologada pelo Promotor de Justiça.
Ora, a experiência tem revelado que a tal discussão sobre a culpa traz uma eternização insuportável a estes processos da área de Família, fazendo-os muito mais passionais do que práticos ou jurídicos. De outro lado, se a culpa pelo fim do relacionamento envolver um fato muito grave (como é a hipótese de agressão física), nada impede que o cônjuge prejudicado se valha da ação de indenização ou mesmo de medidas próprias do processo penal. O que não se justifica, contudo, é atrelar a culpa ao processo de divórcio, tornando o longo e fazendo uma constante a infelicidade dos ex-cônjuges.
De outro lado, se não há interesses de menores ou incapazes, nada justifica a interferência do Ministério Público num divórcio, pois a formalização do mesmo, em casos tais, fica restrita às decisões e valores dos cônjuges. Ademais, o Tabelião e, sobretudo o advogado, indispensável que é à Administração da Justiça (art. 133 CF), saberão orientar o casal da melhor maneira, inclusive no tocante à tentativa de eventual manutenção do vínculo afetivo e conjugal.
É preciso, enfim, que o nosso Poder Legislativo esteja atento à realidade dos fatos e da vida, não produzindo, portanto, normas que a contrariem. Enquanto isto, compete à sociedade ficar atenta!
Fonte: Jornal Estado de Minas, caderno opinião, 19/02/2014