Gratificação e Direito Adquirido

Luiz Fernando Valladão Nogueira – Advogado Fundador do Escritório Valladão Sociedade de Advogados
Fernando Gualberto Scalioni – Advogado no Escritório Valladão Sociedade de Advogados, pós-Graduando em Direito Público pela PUC-MG

PARECER JURÍDICO OPINATIVO

  1. EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. LEI MUNICIPAL QUE INSTITUIU GRATIFICAÇÃO AOS PROCURADORES MUNICIPAIS. AUMENTO DE JORNADA E LOTAÇÃO ESPECÍFICA. VANTAGEM PESSOAL. CONSTITUCIONALIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. DIREITO À PERCEPÇÃO IMEDIATA DA GRATIFICAÇÃO. POSTERIOR SUPRESSÃO DA VERBA. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO ADQUIRIDO AO VALOR NOMINAL DOS VENCIMENTOS.
1. A instituição de gratificação beneficiando determinados servidores públicos que preencherem requisitos específicos, como a majoração da carga horária, não implica em aumento genérico da remuneração e sim vantagem pessoal.
2. A Lei Municipal editada e aprovada por meio de processo legislativo válido é plenamente vigente e passível de produzir seus regulares efeitos até que seja revogada, ou até que tenha sua inconstitucionalidade declarada pelo poder judiciário, por meio de controle concentrado ou difuso de constitucionalidade.
3. Os servidores que preencherem os requisitos legalmente estipulados para percepção de determinada gratificação incorporam ao seu patrimônio jurídico, a partir do termo estipulado para o início da produção de efeitos da Lei que instituiu a referida vantagem, o direito de auferi-la.
4. Em que pese o STF ter consolidado entendimento no sentido de que inexiste direito adquirido à forma como é composta a remuneração, é pacífico naquela Corte que é assegurado ao servidor público a irredutibilidade do valor global da mesma, razão pela qual não pode ser suprimido o pagamento de gratificação já incorporada à remuneração dos servidores sem que outra vantagem ou aumento seja implementado para garantir o valor global já atingido pela remuneração de tais servidores.

  1. SÍNTESE DA CONSULTA

Os solicitantes, todos Procuradores Municipais de Betim-MG, formularam consulta narrando, em síntese, que a Lei Municipal nº 5.459/2013 (inteiro teor em anexo), a qual dispõe sobre a estrutura orgânica da Administração Pública do Município de Betim-MG, determina, em seu art. 28, jornada de 30 horas semanais para o cargo de procurador municipal, além de estipular os níveis de vencimentos da referida carreira.
No entanto, em janeiro de 2014 foi aprovada a Lei Municipal nº 5.659/2014 (inteiro teor em anexo), instituindo a chamada Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência (GRJEP) em prol dos procuradores municipais que preencherem requisitos determinados, nos termos do art. 1º da referida Lei. Transcreve-se:
Art. 1º – Fica criada a Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência – GRJEP a ser paga aos Procuradores Municipais em efetivo exercício do cargo, lotados na Procuradoria-Geral do Município de Betim, em decorrência da atuação nos feitos de natureza judicial e extrajudicial, com carga horária de 40 (quarenta) horas semanais.
É de fácil percepção, então, que a referida Lei limitou o recebimento da Gratificação por ela instituída aos procuradores que reunirem duas condições específicas:
1) Desempenharem jornada de 40 horas semanais, 10 horas por semana a mais do que a jornada regular da carreira;
2) Permanecerem lotados na Procuradoria-Geral do Município de Betim-MG, e não nos demais órgãos administrativos da municipalidade.
Ainda, o mesmo art. 1º, em seu parágrafo 4º, garantiu a todo procurador municipal a possibilidade de lotação na Procuradoria-Geral do Município, ficando a critério do próprio servidor optar por permanecer ou não no órgão em que estiver lotado.
Na mesma esteira, o parágrafo 5º do mesmo artigo determinou ser facultativo o recebimento da referida gratificação, de modo que foi oportunizado a cada um dos procuradores permanecer no regime geral da carreira, com jornada de 30 horas semanais e sem direito à percepção da GRJEP.
Em síntese, o intuito da Lei 5.659/2014 foi o de instituir vantagem pessoal a ser paga àqueles procuradores que optarem (caráter facultativo) por desempenhar jornada de 40 horas semanais e permanecerem lotados na sede da Procuradoria-Geral.
E tal foi a opção dos solicitantes, assim que editada a Lei Municipal 5.659/14.
Noutro giro, outro ponto a ser considerado pelo presente parecer, destacado pelos solicitantes, reside nas disposições do art. 6º da mesma Lei, que ora se transcreve ipsis literis:
Art. 6º – “Esta lei entra em vigor na data de sua publicação e produzirá seus efeitos a partir de 1º de Julho de 2014”
Os solicitantes afirmaram que, por força desse comando, os procuradores optantes pelo novo regime passaram a cumprir carga horária de 40 horas imediatamente após o início da vigência da referida Lei, conforme demonstrado por meio de ofício enviado ao Il. Secretário Municipal Adjunto de Administração (doc. anexo), fazendo jus ao recebimento da GRJEP a partir de 1º de Julho de 2014, data em que a mesma começara a produzir seus efeitos.
Dessa forma, os procuradores que passaram a desempenhar 40 horas de jornada e permaneceram lotados na Procuradoria-Geral do Município de Betim-MG, preenchendo, portanto, os requisitos do art. 1º da Lei 5.659/2014, já fariam jus a percepção da Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência (GRJEP) junto aos seus vencimentos referentes ao mês de Julho/2014, pagos no início do mês de Agosto/2014.
Ocorre que, à época, o Ministério Público enviou ao Il. Prefeito Municipal de Betim-MG uma recomendação no sentido de que a Lei 5.659/2014 deveria ser revogada, por supostamente padecer de inconstitucionalidade. Tal recomendação, que já fora, inclusive, objeto de retratação pelo Il. Parquet, gerou dúvidas acerca da regularidade e obrigatoriedade do pagamento da GRJEP.
Em tal contexto, eis os quesitos jurídicos que nos foram submetidos e que serão elucidados, de forma opinativa, pelo presente parecer:
1) A Lei 5.659/2014, que instituiu a GRJEP, é constitucional e, portanto, passível de produzir seus regulares efeitos?
2) Em caso afirmativo, os procuradores que já preencheram os requisitos elencados pela referida Lei têm direito à percepção imediata da GRJEP?
3) Até quando é assegurado aos solicitantes o pagamento da GRJEP? E, caso a Lei 5.659/2014 seja revogada, persiste o direito à percepção da gratificação por ela instituída?

  1. FUNDAMENTAÇÃO TÉCNICA

A dúvida que paira sobre a constitucionalidade da Lei Municipal 5.659/2014, bem como sobre a sua capacidade de produzir efeitos, é oriunda de uma recomendação do Ministério Público de Minas Gerais (doc. anexo), já reconsiderada pelo próprio Órgão Ministerial (doc. anexo), enviada ao Il. Prefeito Municipal de Betim-MG, Sr. Carlaile Jesus Pedrosa, solicitando a revogação da referida Lei sob pena de enquadramento da conduta do chefe do Executivo Municipal na Lei de Improbidade Administrativa.
Em tal recomendação, o Il. Parquet afirmou que “a gratificação para o exercício do cargo no percentual de 100% do vencimento base, prevista na Lei n. 5.659/2014 é inconstitucional porque concretiza normatização degenerativa da essência do instituto, em desvio de finalidade, por ofensa ao princípio da moralidade administrativa”, e que, “no caso em tela, verificou-se que a pretensão do Poder Executivo foi a de conferir reajuste aos servidores, sem abraçar ônus previdenciários, haja vista que a hipótese fática a ensejar a gratificação pressupõe a ‘atuação nos feitos de natureza judicial e extrajudicial’ (art. 1º) o que representa, em verdade, o próprio núcleo da atividade fim da Procuradoria Municipal”.
E, sob tais argumentos, recomendou o Ministério Público que “o Município de Betim revogue o art. 1º, caput, §§1º e 2º e art. 3º, da Lei 5.659/2014”.
Antes de se adentrar o mérito das alegações do MPMG, que, conforme já dito, já foram objeto de reconsideração pelo próprio Parquet, salta aos olhos, de plano, que o documento por ele enviado inicialmente ao Il. Prefeito Municipal se trata apenas de mera recomendação, sem qualquer força normativa ou efeito vinculante, até mesmo porque o Ministério Público não detém competência para tal.
Dessa forma, em que pese a recomendação de que a Lei 5.659/2014 seja revogada, ela continua plenamente vigente e produzindo efeitos, eis que ainda não houve a edição de qualquer ato normativo pelo Poder Legislativo efetuando, de fato, a referida revogação.
Do mesmo modo, a inconstitucionalidade da Lei 5.659/2014 não fora sequer questionada junto ao poder judiciário, razão pela qual não se pode cogitar a suspensão de seus efeitos concretos pela via do controle concentrado ou difuso de constitucionalidade.
Por conseguinte, estando a Lei Municipal 5.659/2014 em plena vigência, sob nenhuma hipótese pode o Il. Prefeito Municipal, bem como o Il. Secretário Municipal Adjunto de Administração, descumpri-la, à revelia do direito dos terceiros de boa-fé atingidos por suas disposições.
Num primeiro plano, então, tem-se que até que seja declarada judicialmente a inconstitucionalidade da Lei Municipal 5.659/2014, ou que a mesma seja revogada, ela é ato normativo válido, regular e vigente, passível de produzir todos os efeitos jurídicos dela decorrentes.
No entanto, salta aos olhos também o equívoco da recomendação ministerial, ante a constitucionalidade da Lei Municipal 5.659/2014, bem como o fato de que, ainda que por conveniência seja revogada a referida Lei, da mesma forma não pode ser suprimido o pagamento da GRJEP aos procuradores que a ela fazem jus.
Conforme já dito, o fundamento central utilizado pelo parecer ministerial foi o de que a Gratificação instituída pela Lei 5.659/2014 significaria, na verdade, verdadeiro reajuste de vencimentos, eis que, supostamente, seria paga em contrapartida ao exercício da própria atividade fim da Procuradoria Municipal, abrangendo, assim, a totalidade dos procuradores.
Sob tal argumento, concluiu-se que a majoração da remuneração dos servidores deve ser feita por lei específica para tal objetivo, e não na forma de gratificação, a fim de não se configurar desvio de finalidade e ofensa ao princípio da moralidade administrativa.
Concessa venia, em nossa opinião não razão assiste ao Órgão Ministerial.
De início, cumpre conceituar o que são vantagens pessoais e, mais especificamente, as gratificações, e em contrapartida a quê as mesmas serão instituídas aos servidores.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, citando a clássica obra de Hely Lopes Meirelles, afirma que, “para ele (Hely Lopes Meirelles, 1989:400), ‘vantagens pecuniárias são acréscimos de estipêndio do funcionário, concedidos a título definitivo ou transitório, pela decorrência do tempo de serviço (ex facto temporis), ou pelo desempenho de função especiais (ex facto officii), ou em razão das condições anormais pessoais do servidor (propter laborem), ou, finalmente, em razão de condições pessoais do servidor (propter personam)’ ”.
Por sua vez, o saudoso administrativista, ao definir o conceito específico de “gratificações”, afirma que as mesmas “são vantagens pecuniárias atribuídas precariamente aos servidores que estão prestando SERVIÇOS COMUNS DA FUNÇÃO EM CONDIÇÕES ANORMAIS de segurança, salubridade ou onerosidade (gratificações de serviço), ou concedidas como ajuda aos servidores que reunam as condições pessoais que a lei especifica (gratificações especiais)”.
Nesse sentido, para se instituir uma determinada gratificação não é necessário que a mesma esteja condicionada à prestação de um serviço excepcional, diferenciado, pelo servidor, mas tão somente que o serviço comum da função por ele exercida seja desempenhado em condição anormal e mais rigorosa de trabalho.
A título exemplificativo, confira-se os julgados:
“A gratificação de horas extra e o adicional noturno são espécies de vantagens pecuniárias eventuais, INSTITUÍDAS PARA RECOMPENSAR O ÔNUS DECORRENTE DO TRABALHO NORMAL DO EXECUTADO EM CONDIÇÕES EXTRAORDINÁRIAS”.
“O adicional de insalubridade é vantagem pecuniária que não se caracteriza como adicional, mas gratificação de serviço (propter laborem). VERBA INSTITUÍDA PARA RECOMPENSAR OS RISCOS OU ÔNUS DECORRENTES DE TRABALHOS NORMAIS EXECUTADOS EM CONDIÇÕES ANORMAIS DE PERIGO OU ENCARGOS PARA O SERVIDOR”.
Assim, pode-se dizer, já sob a moldura do presente caso, que nada obsta a instituição de gratificação como contrapartida àqueles procuradores municipais que exercem pura e simplesmente a função de procurador, prestando os serviços chamados normais para o referido cargo, mas o fazendo em condição mais rigorosa de trabalho, qual seja, em carga horária de 40 horas semanais ao invés das 30 horas anteriormente estabelecidas pela Lei Municipal 5.459/2013.
Por outro lado, o que afasta de tal gratificação o caráter de aumento genérico dos vencimentos, como sustentou o Il. Parquet, é o fato de que nem todos os procuradores municipais passaram a trabalhar sob o regime mais rigoroso, visto que a Lei 5.659/2014 definiu, de forma expressa, que a adesão à nova carga horária, e, portanto, à GRJEP, é facultativa (art. 1º, § 5º).
Formou-se, então, o seguinte cenário:
Ø O art. 1º da Lei Municipal 5.659/14 é cristalino ao determinar que a Gratificação por ele instituída é devida somente aos procuradores lotados na Procuradoria-Geral do Município de Betim e que desempenharem jornada diferencial, com carga horária semanal de 40 horas, 10 horas a mais do que a jornada regular da carreira de procurador municipal, estabelecida pelo art. 28 da Lei Municipal 5.459/13;
Ø Dessa forma, a GRJEP não possui caráter de reajuste genérico, mas sim de vantagem pessoal, eis que representa contrapartida àqueles procuradores que optaram por regime mais rigoroso de trabalho;
Ø Tanto assim o é que o § 5º do art. 1º da Lei 5.659/14, expressamente, assentou o caráter facultativo da GRJEP, de modo que cada procurador, individualmente, pode optar pelo regime geral da carreira (30 horas semanais em qualquer órgão da Administração Pública, sem direito à gratificação) ou pelo novo regime diferenciado (40 horas semanais obrigatoriamente cumpridas na sede da Procuradoria-Geral, com direito à gratificação);
Ø Dessa forma, ante o caráter de vantagem pessoal da GRJEP, afigura-se perfeita a adequação da Lei Municipal 5.659/14 à sua finalidade.
Insta salientar que o precedente do Eg. TJMG (ADI 1.0000.13.061194-0/000, Rel. Des. Edílson Fernandes) citado na recomendação aviada pelo MPMG ao Prefeito Municipal de Betim não se aplica ao caso em comento, visto que, naquela ocasião, aprovou-se lei delegando ao administrador público o poder de conceder, POR MEIO DE DECRETO, gratificações de até 100% do vencimento de cargo em comissão ocupado por servidor, o que viola flagrantemente o art. 37, X, da CRFB/88 e o Princípio da Separação dos Poderes. Confira-se:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LC Nº 008/2002, Nº 011/2005 E 25/2013 – CRIAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO – ATRIBUIÇÕES E FUNÇÕES NÃO ESPECIFICADAS EM LEI – CARGOS DE NATUREZA BUROCRÁTICA OU TÉCNICA – RELAÇÃO DE CONFIANÇA – AUSÊNCIA – GRATIFICAÇÃO DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA A SER INSTITUÍDA POR MEIO DE DECRETO – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA RESERVA LEGAL E DA MORALIDADE PÚBLICA – PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. São inconstitucionais normas legais municipais que criam cargos em comissão para o exercício de funções técnicas, burocráticas ou operacionais, de natureza puramente profissional, fora dos níveis de direção, chefia e assessoramento, além de não especificarem de modo detalhado as respectivas atribuições. É inconstitucional a norma legal que delega ao administrador público a concessão, POR MEIO DE DECRETO, de gratificação de até 100% do vencimento do cargo em comissão ocupado pelo servidor, visto implicar em burla aos princípios da reserva legal e da moralidade pública”.
Do voto do Em. Des. Relator colhe-se importante fragmento:
“A previsão de pagamento da gratificação a qualquer servidor confere poderes discricionários ao administrador, incompatíveis com o regime jurídico da Administração Pública, em especial o disposto no artigo 37, X da Constituição da República, que veda o pagamento de remuneração ou a sua alteração sem que esteja devidamente prevista em Lei, ainda mais quando se trata de vantagem pecuniária de servidor público, como é o caso da “Gratificação de Dedicação Exclusiva” ora em comento. O dispositivo legal examinado terminou por delegar ao Chefe do Executivo o poder de legislar, criando vantagem e gerando, portanto, despesas ao erário sem autorização legal específica que esteja lastreada em disponibilidade orçamentária do ente público. A faculdade de criação e outorga de gratificação de até 100% do vencimento do cargo ocupado pelo servidor comissionado, por critério de conveniência e oportunidade do Prefeito, vulnera os princípios da legalidade e da moralidade administrativa, nos termos dos artigos 13 e 165, § 1º, da Constituição Estadual”.
Já no caso em tela a gratificação fora criada por Lei específica para tal fim e regularmente aprovada pelo Poder Legislativo, em total respeito ao art. 37, X, da CRFB/88 e ao Princípio da Separação dos Poderes, configurando-se, portanto, hipótese bem diversa da do precedente utilizado pelo Órgão Ministerial em sua recomendação.
Diante de tais fatores, os procuradores municipais apresentaram junto ao órgão ministerial, inclusive, um pedido de reconsideração (doc. anexo), alertando o il. Parquet acerca das peculiaridades do caso em apreço. E, como era de se esperar, tal pedido fora acolhido, de modo que o próprio Ministério Público retificou seu posicionamento opinando pela desnecessidade de revogação da Lei Municipal 5.659/14 (doc. anexo).
Portanto, a constitucionalidade da Lei 5.659/2014 é palmar, razão pela qual eventual Ação Direita de Inconstitucionalidade contra ela direcionada certamente estará fadada ao insucesso.
Importante considerar também que, ainda que o Il. Prefeito Municipal, por mera conveniência administrativa, tome as providências necessárias para a efetiva revogação da Lei Municipal 5.659/14, continuará sendo devido o pagamento da GRJEP aos ora impetrantes, por força do “direito adquirido” dos mesmos ao recebimento da referida vantagem.
Nas palavras do Il. jurista mineiro Caio Mário da Silva Pereira, conceituando o aludido instituto:
“Direito adquirido, in genere, abrange os direitos que o seu titular ou alguém por ele possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo ou condição preestabelecida, inalterável ao arbítrio de outrem. São os direitos definitivamente incorporados ao patrimônio do seu titular, sejam os já realizados, sejam os que simplesmente dependem de um prazo para seu exercício, sejam ainda os subordinados a uma condição inalterável ao arbítrio de outrem. A lei nova não pode atingi-los, sem retroatividade”.
A impossibilidade de novel legislação atingir o Direito Adquirido emana da própria Constituição de 1988, bem como da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Confira-se:
Art. 5º, XXXVI, da CRFB/88 – “A lei não prejudicará o DIREITO ADQUIRIDO, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Art. 6º da LINDB – “A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, O DIREITO ADQUIRIDO e a coisa julgada”.
In casu, os solicitantes preencheram todos os requisitos estipulados pela Lei vigente para o recebimento da GRJEP, permanecendo lotados na sede da Procuradoria-Geral do Município de Betim e trabalhando 40 horas semanais, conforme demonstrado no ofício aviado ao Exmo. Secretário Municipal Adjunto de Administração (doc. anexo).
Dessa forma, a partir de 1º de julho de 2014, data em que a Lei Municipal 5.659/14 passou a produzir seus efeitos, incorporou-se ao patrimônio jurídico dos referidos procuradores o direito à percepção da Gratificação, ou seja, tal vantagem tornou-se “direito adquirido” dos mesmos.
Tal fato fora reconhecido pelo próprio Poder Executivo do Município de Betim-MG, o qual publicou, no Diário Oficial do Município do dia 25 de Janeiro de 2014 (doc. anexo), o seguinte comunicado:
“Caro servidor, a administração pública de Betim, sensível à reivindicação de alguns servidores do município, estudou a possibilidade de revogação das leis que adequaram a remuneração de algumas classes funcionais em relação ao que é praticado em todo país. Contudo, tal ato estaria contrariando a disposição constitucional de ‘irredutibilidade de vencimentos dos servidores’, visto que, com a sanção e a publicação dessas leis, as readequações já se integraram ao patrimônio do servidor, tornando-se direito adquirido. Também existe a possibilidade de uma lei retroagir seus efeitos para prejudicar quem quer que seja. Diante disso, decidiu-se pela criação de uma comissão de servidores, para que sejam reformulados o Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos e o Estatuto dos Servidores, defasados e não condizentes com o anseio do funcionalismo. (…) Waldir Teixeira, Prefeito em exercício de Betim”.
Essa orientação, diga-se de passagem, amolda-se perfeitamente à jurisprudência advinda do Excelso Supremo Tribunal Federal sobre a matéria. Observe-se:
“SERVIDOR. GRATIFICAÇÃO INSTITUIDA POR LEI E INCORPORADA AOS PROVENTOS. REVOGAÇÃO POR LEI POSTERIOR. ALEGADA CONTRARIEDADE AOS ARTS. 5., INC. XXXVI, E 97 DA CONSTITUIÇÃO. SUMULAS 282 E 356. (…). O acórdão recorrido reconheceu o direito adquirido do servidor a integração em seu patrimônio de vantagem instituída por lei, embora abolida supervenientemente. Efeitos da lei revogada que subsistem intangíveis pela administração. Agravo regimental improvido”.
Colhe-se, do voto do Il. Ministro Relator, precioso fragmento que bem ilustra o presente caso:
“No tocante à questão do direito adquirido, a agravante parte da premissa de que inexiste direito adquirido às gratificações em discussão, posto que constituía um direito enquanto em vigor a lei instituidora; revogada esta, o direito deixou de existir. No RE 109.287 (RTJ 119/1293), relator Ministro Célio Borja, este Tribunal reconheceu direito adquirido à percepção de gratificação, incorporada ao patrimônio segundo a legislação que a instituiu, embora posteriormente revogada pelo advento de nova norma. Diz a ementa do acórdão:
‘Funcionalismo, gratificação endereçada a funcionário público, provido em caráter efetivo, que tiver exercido, esteja exercendo ou venha a exercer função gratificada, cargo de direção ou cargo em comissão, instituída por lei, de 23.11.76, e revogada por lei posterior, de 1.4.77. Efeitos produzidos pela lei revogada não são passíveis de extinção pela lei revocatória, ante o estatuído no § 3º, do art. 153 da Constituição Federal. O preenchimento dos requisitos previstos na lei revogada, ao tempo do seu viger, assegurou ao funcionário a integração em seu patrimônio do direito a vantagem, depois abolida pela lei subsequente. RE conhecido e provido’.
É certo que a administração é conferido o poder de anular seus próprios atos desde que inquinados de nulidade. Todavia, não se pode desconsiderar a legalidade de que se revestiu o ato, que gerou o direito adquirido à incorporação das gratificações ao patrimônio do agravado, intangível pela administração. Nessa conformidade, correto o acórdão recorrido que reconheceu direito subjetivo patrimonial, segundo a lei vigente, embora já revogada pelo advento de lei nova que suprimiu a gratificação”.
Portanto, ainda que se revogue a Lei Municipal 5.659/14, a gratificação por ela instituída já se incorporou no patrimônio jurídico dos impetrantes, de modo que estes possuem “direito adquirido” a sua percepção, imutável, ainda que novel legislação venha a suprimir, futuramente, a existência da GRJEP.
Frise-se que o mesmo Supremo Tribunal Federal já definiu que a expectativa de direito transmuta-se em direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos para sua percepção. Observe-se:
“Para a aquisição do direito, ou seja, para o ingresso deste no patrimônio do pretenso titular, seria mister que, antes da revogação, se houvessem reunido e consumado todos os elementos, isto é, os fatos idôneos à sua constituição ou produção. Ou seja, no caso concreto, que algum serviço tenha sido prestado, sob a égide da lei anterior”
Em matéria previdenciária o Excelso Supremo Tribunal Federal inclusive sumulou a matéria:
Súmula 359/STF – “Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, REUNIU OS REQUISITOS NECESSÁRIOS”.
É certo, então, que adquire-se um direito no exato momento em que se preenche todos os requisitos para sua efetivação, ocasião em que o mesmo se incorpora na esfera patrimonial do seu titular.
No caso em tela, como exaustivamente mencionado, os solicitantes preencheram todos os requisitos necessários para a percepção da GRJEP. Além disso, a Lei que a instituiu notoriamente passou a produzir efeitos a partir de 1º de Julho de 2014, por força de disposição expressa contida em seu art. 6º.
Não há dúvidas, portanto, de que o recebimento da Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência, instituída pela Lei Municipal 5.659/2014, é direito adquirido dos impetrantes. E tal fato, nos termos da jurisprudência do Ex. STF, induz ao raciocínio de que, ainda que se revogue a referida lei, subsiste o direito à percepção da verba, por se tratar de direito adquirido albergado pelos arts. 5º, XXXVI, da CRFB/88 e 6º da LINDB.
Importante mencionar que o Ex. Supremo Tribunal Federal também já decidiu que “não há direito adquirido a regime jurídico, sendo possível, portanto, a redução ou mesmo a supressão de gratificações ou outras parcelas remuneratórias, DESDE QUE PRESERVADO O VALOR NOMINAL DA REMUNERAÇÃO”.
Em outras palavras, explica o Pretório Excelso que “não há direito adquirido a regime jurídico-funcional pertinente à composição dos vencimentos nem à permanência do regime legal de reajuste de vantagem, desde que eventual modificação introduzida por ato legislativo superveniente preserve o montante global da remuneração, não acarretando decesso de caráter pecuniário”.
Quanto a este particular, alguns esclarecimentos merecem ser tecidos.
José dos Santos Carvalho Filho preleciona, acerca do Princípio da Irredutibilidade de Vencimentos, que “a leitura da regra constitucional deve levar em consideração o vencimento básico do cargo, o salário contratado e as parcelas incorporadas, que passam, na verdade, a integrar a parcela básica”, e que “não se incluem, todavia, na garantia da irredutibilidade os adicionais e as gratificações devidos por força de circunstâncias específicas e muitas vezes de caráter transitório”.
Ressalta o administrativista, no entanto, que “a ampliação da jornada de trabalho pode provocar ofensa ao princípio da irredutibilidade. Se a jornada alcança certo número de horas semanais – por exemplo, 30 horas – e o regime passa a ser de 40 horas, a essa ampliação deve corresponder o aumento da remuneração para o fim de ficar adequada ao novo regime. A PERSISTÊNCIA DO VENCIMENTO ANTERIOR, DIANTE DO AUMENTO DA JORNADA, VULNERA O ALUDIDO PRINCÍPIO”.
Exatamente esta a hipótese aqui estudada.
Conforme já mencionado, a GRJEP foi instituída como contrapartida aos procuradores que optassem por desempenhar 40 horas semanais ao invés das 30 horas estabelecidas pela Lei 5.459/2013, passando a integrar, de fato, a parcela básica dos optantes do novo regime.
Se assim não fosse, o aumento da jornada de trabalho dos solicitantes de 30 para 40 horas semanais, sem a referida gratificação como contrapartida, configuraria flagrante violação ao Princípio da Irredutibilidade dos Vencimentos, conforme mencionou o Il. Administrativista José dos Santos Carvalho Filho, aqui citado.
E, justamente por tal razão, é que pode se dizer que a Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência, instituída pela Lei 5.659/14, por representar contrapartida a um aumento definitivo (e não temporário) da jornada de trabalho (cuja adesão é facultativa, ressalta-se), trata-se de parcela da remuneração incorporada ao vencimento base do servidor, e, portanto, albergada pela irredutibilidade dos vencimentos.
Destaca-se que, por se tratar de contrapartida a um aumento definitivo (e facultativo) de jornada, e não de mera retribuição a um serviço excepcional prestado pelos procuradores, a gratificação ora em comento (GRJEP) não se trata de vantagem pro labore faciendo, o que é extremamente relevante para o presente caso.
Explica-se:
Ø Nos termos do entendimento comumente adotado pela jurisprudência pátria, as vantagens pro labore faciendo são aquelas cujo “pagamento será devido segundo o esforço despendido pelo servidor, o grau de complexidade da tarefa e a responsabilidade do cargo”. Justamente por tal razão, têm como principal característica o fato de que seu pagamento “não se incorpora ao vencimento, EIS QUE SEU VALOR É VARIÁVEL”.
Ø Por isso, decide-se nos Tribunais que “não há direito líquido e certo ao recebimento de gratificações de natureza ‘propter laborem’ e ‘pro labore faciendo’ que, POR SEREM DEVIDAS EM FUNÇÃO DA PRODUTIVIDADE INDIVIDUAL DE CADA SERVIDOR, e não em caráter geral, não se enquadram no conceito de vencimentos integrais”
Ø Ocorre que a GRJEP, in casu, não é paga segundo o esforço, grau de zelo ou complexidade da tarefa despendida por cada servidor individualmente, bem como não configura uma contrapartida a uma situação transitória ou excepcional de trabalho.
Ø Na verdade, a gratificação ora em apreço é paga em decorrência da criação de um novo regime facultativo de trabalho, no qual os procuradores municipais por ele optantes passarão a desempenhar, DEFINITIVAMENTE, carga horária de 40 horas semanais, 10 horas a mais que o regime regular da carreira;
Ø Dessa forma, a GRJEP é paga, mediante valor fixo, a todos aqueles procuradores que optaram pelo novo regime de trabalho (40 horas semanais), não se tratando de mera gratificação pro labore faciendo, mensurada pelo desempenho individual, mas sim genérica, paga igualitariamente a todos os servidores que cumprirem com a nova jornada.
Perceba-se, então, o caráter sui generis da Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência instituída pela Lei 5.659/2014:
• Como já dito, não se trata de uma gratificação genérica que se confunde com a majoração pura dos vencimentos, já que não atinge a todos os procuradores municipais, mas tão somente aqueles que optarem pelo novo regime de trabalho.
• Por outro lado, não se trata de gratificação pro labore faciendo, paga em função do desempenho individual de cada servidor, mas sim de contrapartida fixa a todos aqueles que optarem pelo novo regime, que é definitivo.
Não se tratando a GRJEP, portanto, de contrapartida a uma situação transitória e individual de trabalho, mas sim situação coletiva e definitiva, bem como sendo seu valor fixo, no importe de 100% do vencimento base inicial da carreira (art. 1º, § 2º da Lei 5.659/2014), tem-se que tal verba, por interpretação sistemática dos entendimentos sobre a matéria, incorpora-se aos vencimentos dos servidores que a ela fazem jus.
Em caso símile, o Eg. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina reconheceu o caráter peculiar da gratificação instituída em contrapartida a um aumento definitivo da carga horária de trabalho, determinando a sua incorporação aos vencimentos dos servidores. Confira-se:
“ADMINISTRATIVO – MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS – JORNADA NORMAL DE 30 HORAS SEMANAIS – SERVIDOR PÚBLICO QUE OPTOU PELA JORNADA DE 40 HORAS – DIREITO À GRATIFICAÇÃO DE JORNADA DE 33,33% INSTITUÍDA PELA LEI N. 4.049/93 – NATUREZA JURÍDICA DE COMPLEMENTAÇÃO DO VENCIMENTO PELAS 10 HORAS A MAIS DE TRABALHO – CIRCUNSTÂNCIA QUE AUTORIZA A INCIDÊNCIA DA GRATIFICAÇÃO ESPECIAL DA LEI N. 4.222/93 SOBRE A REFERIDA VANTAGEM – PREVISÃO LEGAL EXPRESSA – VEDAÇÃO DO ART. 37, XIV, DA CF/88 – INOCORRÊNCIA – COBRANÇA DA DIFERENÇA DE REMUNERAÇÃO – SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA.
1. De acordo com a Lei n. 4.049/93, o servidores do Município de Florianópolis que optaram pela jornada de 40 horas semanais. em vez de cumprirem a carga horária normal de 30 horas, pelas 10 horas a mais têm direito a uma gratificação especial de 33,33% sobre a qual incide a gratificação especial instituída pela Lei Municipal n. 4.222/93, sem que isso importe em ofensa à vedação do efeito cascata previsto no art. 37, inciso XIV, da Constituição Federal de 1988, JÁ QUE A GRATIFICAÇÃO DE JORNADA TEM A NATUREZA JURÍDICA DE COMPLEMENTAÇÃO DO VENCIMENTO EM RAZÃO DO TRABALHO, POR OPÇÃO, EM HORÁRIO SEMANAL SUPERIOR À JORNADA NORMAL”.
Ø Por conseguinte, então, A GRATIFICAÇÃO SUB JUDICE ENCONTRA-SE ALBERGADA PELO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS.
Ante todos esses apontamentos, conclui-se que o Município de Betim só pode se abster de pagar a GRJEP aos impetrantes se, por meio da concessão de outra vantagem, gratificação, ou majoração dos vencimentos, mantiver o valor nominal da remuneração global dos mesmos, por força do Princípio Constitucional da Irredutibilidade de Vencimentos, de aplicação consagrada pelo Ex. STF.
O Eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais também já enfrentou a questão. Observe-se:
“APELAÇÃO CÍVEL – ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE SÃO SEBASTIÃO DO PARAÍSO – GRATIFICAÇÃO POR TEMPO DE SERVIÇO – EXTINÇÃO – DIREITO ADQUIRIDO DOS SERVIDORES QUE JÁ A RECEBIAM – FORMA DE CÁLCULO DA GRATIFICAÇÃO – IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS – IMPOSSIBILIDADE – HONORÁRIOS – MAJORAÇÃO.
– A gratificação por tempo de serviço, extinta pela Lei Municipal 1985/92, deve ser assegurada aos servidores que já a recebiam antes da extinção, devendo ser preservada, também, a forma de cálculo de percentual sobre o vencimento básico.
– A conversão da gratificação para valor fixo, e o ‘congelamento’ desse valor acarretou prejuízos remuneratórios para o servidor, em violação à garantia da irredutibilidade de vencimentos, previsto no artigo 37, XV, da Constituição Federal”.
Perceba-se, então, que se a modificação do regime jurídico de cálculo da remuneração acarretar prejuízo pecuniário ao servidor, deverão ser preservadas, para aqueles que já as recebiam, as vantagens pessoais anteriores, em nome do princípio constitucional da Irredutibilidade de Vencimentos.
Portanto, sob qualquer ângulo que se analise a matéria, qualquer ato que simplesmente suprima o pagamento da GRJEP aos solicitantes, acarretando-lhes decréscimo remuneratório, afigura-se ilegal, imotivado e lesivo a direito líquido e certo já adquirido por eles.
Por fim, cumpre ainda destacar que, nos termos do art. 3º da Lei Municipal 5.659/2014, o pagamento da GRJEP aos procuradores que a ela fizerem jus encontra-se assegurado pelo Município de Betim até 31 de Dezembro de 2015. A partir de tal data, nos termos do art. 2º, caput e parágrafo único, da mesma Lei, deverá ser efetivado aumento real nos vencimentos dos procuradores, conforme a nova redação dada ao art. 31 da Lei Municipal 5.459/2013. Confira-se:
“A partir de 01 de Janeiro de 2016 o vencimento inicial do Grupo Ocupacional AL (Procurador Municipal), do Anexo I, Quadro Setorial da Administração I-A – Classes de cargos comuns e específicos de provimento efetivo da Lei 2.886, de 05 de Julho de 1996, passará a ser o valor à época, correspondente ao nível 65-C6 do Grupo Ocupacional AL, mantidas as vantagens pessoais”.
Bom frisar que a Gratificação de Representação Judicial, Extrajudicial e Permanência (GRJEP) não poderá ser suprimida a partir de 01 de Janeiro de 2016 sem que seja realmente implementado o aumento real, de igual ou maior montante que a atual gratificação, aos vencimentos dos procuradores, ou, ao menos, que outra vantagem seja criada para manter o valor nominal da remuneração.
Isso porque, conforme já explicitado, com base no Princípio Constitucional da Irredutibilidade de Vencimentos, o ex. STF consolidou entendimento no sentido de que, em que pese não existir direito adquirido a regime jurídico, existe direito adquirido ao valor nominal da remuneração.
Dessa forma, ainda que a Lei Municipal 5.659/2014 garanta o pagamento da GRJEP apenas até o dia 31 de Dezembro de 2015 (art. 3º), tal vantagem só poderá ser suprimida se efetivado o aumento real previsto pelo art. 2º da mesma Lei, ou se criada outra vantagem que mantenha, ou eleve, o valor nominal da remuneração.

  1. CONCLUSÕES

Tecidas as considerações acima, seguem as conclusões obtidas neste parecer, quesito a quesito:

QUESITO 01:
1.1 A Lei Municipal 5.659/2014 é plenamente constitucional, eis que editada e aprovada por meio de processo legislativo idôneo, bem como por seu conteúdo se conformar aos princípios constitucionais basilares que orientam a Administração Pública.
1.2 Da mesma forma, ainda que sua constitucionalidade tenha sido inicialmente questionada pelo Órgão Ministerial, por meio de recomendação já retratada, a Lei Municipal 5.659/2014 só deixaria de produzir seus regulares efeitos por meio de decisão do Poder Judiciário em sede de controle concentrado ou difuso de constitucionalidade, ou caso sejam efetivadas as providencias para sua revogação, o que ainda não ocorreu.
1.3 Portanto, a Lei Municipal 5.659/2014 é constitucional, válida, vigente e passível de produzir seus regulares efeitos.

QUESITO 02:
2.1 Os requisitos para a percepção da Gratificação instituída pela Lei Municipal 5.659/2014 são: (i) desempenho de jornada de 40 horas semanais e; (ii) lotação na procuradoria geral do município.
2.2 Os procuradores que preencheram tais requisitos (doc. anexo) passaram a fazer jus à percepção imediata da GRJEP a partir do dia 1º de Julho de 2014, data estipulada pelo art. 6º da referida Lei para o início da produção de seus efeitos.
2.3 Portanto, os procuradores municipais que preencheram os requisitos elencados por lei e fizeram jus à percepção da GRJEP devem recebê-la já no pagamento realizado no início do mês de Agosto/2014 (normalmente até o quinto dia útil), referente ao mês de Julho/2014.
QUESITO 03:
3.1 O pagamento da GRJEP é assegurado aos procuradores que a ela fizeram jus até o dia 31 de Dezembro de 2015, data estipulada pelo art. 3º da Lei Municipal 5.659/2014.
3.2 A partir de tal data, em decorrência do entendimento jurisprudencial consolidado pelo c. STF, apenas poderá ser suprimido o pagamento da GRJEP se implementado aumento real nos vencimentos dos referidos servidores (in casu, estipulado expressamente pelo art. 2º da mesma Lei), ou se criada outra vantagem capaz de manter intacto o valor nominal da remuneração dos mesmos.
3.3 Embora não haja direito adquirido a regime jurídico de remuneração, existe o direito adquirido ao valor nominal da remuneração, à qual, no presente caso concreto, já foram incorporados os valores auferidos pelos solicitantes a título de GRJEP.
3.4 Portanto, em decorrência do direito adquirido pelos solicitantes ao valor da GRJEP, apenas poderá ser deles suprimido o pagamento da referida gratificação se mantido, por outros meios, o valor nominal da remuneração, preferencialmente por meio do aumento real (a partir de 01 de Janeiro de 2016) estipulado pela própria Lei que instituiu a gratificação.