Por: Luiz Fernando Valladão, advogado, professor universitário e Procurador do Município de Belo Horizonte; e Lucas Valladão Nogueira, advogado da Valladão Sociedade de Advogados.
No início dos anos 2000, foi criada no âmbito federal, a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA). Poucos anos depois, o Estado de Minas Gerais, por sua vez, instituiu a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental do Estado de Minas Gerais (TFAMG).
O fato gerador de ambas as exações é o mesmo: “o exercício regular do poder de polícia para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.” Como contribuinte, a legislação definiu que são aqueles que exercem as “atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais”, da forma como estão expressamente previstas nos anexos das leis.
É importante observar que as taxas aqui mencionadas foram criadas com a finalidade de financiar o poder de polícia exercido especificamente sobre as atividades potencialmente poluidoras. Isso, evidentemente, com o objetivo de preservar o meio ambiente. De fato, é indiscutível a relevância de sua preservação, até mesmo porque a proteção e o equilíbrio da natureza são imprescindíveis para a manutenção da vida na Terra.
O ordenamento jurídico, acompanhando essa perspectiva, deu a devida relevância ao assunto. Um exemplo é o fato de a Constituição Federal ter colocado nas mãos de todos os entes da federação a competência para, harmoniosamente, executarem medidas que visem “a proteção do meio ambiente, o combate à poluição em qualquer de suas formas e a preservação das florestas, da fauna e da flora” (art. 23, VI e VII da CF/88). No mesmo sentido, o art. 225 da Carta Magna reza que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
No entanto, a despeito da importância dada à preservação do meio ambiente, os tributos criados com essa finalidade, como é o caso das taxas citadas anteriormente, não podem ser impostos aos cidadãos de forma arbitrária e ilegal. Também aí devem ser observados princípios constitucionais tributários.
Por exemplo, é ilegal a incidência das referidas taxas sobre empreendimentos que exerçam atividades que não estão previstas nos anexos da legislação. Ou, ainda, que exerçam apenas de forma secundária a atividade ali prevista.
Como dito, o legislador elencou expressamente quais são as atividades potencialmente poluidoras que, quando constituem o objeto principal da empresa, sujeitam-se à incidência da Taxa. E, somente é possível exigi-la se a atividade empresarial principal exercida for exatamente a mesma prevista na legislação.
Não se pode admitir uma interpretação extensiva e analógica para enquadrar a atividade principal de determinado empreendimento no fato gerador do tributo, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da Reserva Legal Tributária (art. 150, I da CRFB/88), e mesmo, no plano infraconstitucional, à norma que veda o uso de analogia para exigir tributo (art. 108, §1º do CTN),
A legalidade tributária é de fundamental importância no ordenamento jurídico brasileiro. Tanto que é classificada, assim como todas outras limitações do poder de tributar previstas no art. 150 da CRFB/88, como garantia fundamental do contribuinte.
Justamente em respeito a tal garantia fundamental, as normas tributárias devem ser completas e claras, de modo a restar inequívoco, ao contribuinte, se sobre determinada circunstância incide ou não o tributo. Com efeito, a norma deve prever todos os aspectos que determinam quem terá que pagar, quanto, a quem e por quais fatos ou circunstâncias.
Por exemplo: no código 16 do Anexo I da legislação estadual, estabeleceu-se como atividade potencialmente poluidora o “transporte de cargas perigosas”. Nesse sentido, é ilegal que o órgão ambiental, fundado nesta descrição do código 16, exija de empresas de transporte exclusivo de passageiros o recolhimento da taxa.
Outro exemplo: o IBAMA passou a cobrar a taxa ambiental de empresas que comercializam material de construção em geral, justificando-se no código 20 do Anexo VIII da lei federal 10.165/00, que elenca como atividade potencialmente poluidora a “exploração econômica da madeira ou lenha e subprodutos florestais”. Entretanto, em prestígio à estrita legalidade tributária, tal cobrança se mostra ilegal, uma vez que, conforme entendimento jurisprudencial, “a previsão legal diz respeito tão-somente a atividades diretamente ligadas à extração de madeira ou outros subprodutos florestais. Assim, apenas se enquadrariam pessoas jurídicas que realizassem diretamente a exploração e não as que posteriormente vêm a operar com produtos derivados.”[1]
De fato, não obstante a importância dada pela própria Constituição Federal à proteção e preservação do meio ambiente, não se pode admitir o maltrato a institutos tão caros do direito tributário como a estrita legalidade e a vedação do uso de analogia.
Deve-se destacar, ainda, que o não enquadramento de determinadas atividades na obrigação de recolher as taxas não significa que o empreendimento ficará sem sofrer qualquer tipo de fiscalização e controle ambiental do poder público.
Há outros mecanismos que possibilitam a fiscalização sobre as atividades. O alvará de funcionamento e o próprio licenciamento ambiental, além de atestarem a regularidade do funcionamento da empresa, são instrumentos através dos quais os órgãos públicos exercem amplo poder de polícia.
Portanto, caso seja constatado que as taxas ambientais estão sendo exigidas de empreendimentos que não exercem de forma principal atividades “potencialmente poluidoras” exatamente da forma como previsto na legislação, cabe ao Poder Judiciário intervir para obstar tais ilegalidades.
Sobre os autores
Luiz Fernando Valladão é professor universitário, procurador do município de Belo Horizonte e sócio-fundador da Valladão Sociedade de Advogados.
Lucas Valladão Nogueira Fonseca é advogado da Valladão Sociedade de Advogados e pós-graduando em direito ambiental
Publicação: Jornal Valor (caderno Legislação e Tributos), 26/03/2014.