Luiz Fernando Valladão, advogado, professor universitário e Procurador do Município de Belo Horizonte.
A Comissão de Direito e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou, recentemente, Projeto de Lei que regulamenta a figura do “paralegal”. A proposta esclarece que se trata aí do profissional que já formou em Direito, mas não logrou êxito no exame da OAB, sendo que o mesmo teria as prerrogativas de exercer a advocacia em conjunto com o advogado e sob responsabilidade deste.
Ora, tal criação, se aprovada, jogará no mercado milhões de novos profissionais, que ficarão numa espécie de limbo, visto não serem nem advogados, nem estagiários. Por certo, sob a ótica remuneratória, assim também serão tratados.
Por um lado, isso poderá fazer com que muitos desses “paralegais” não mais se esforcem para obter aprovação no exame da OAB – uma vez que estarão ocupados em suas novas atividades – e, assim, perderão a grande oportunidade de realização profissional.
De outro lado, perderão os advogados e a sociedade. Sim, esses paralegais serão confundidos pelos clientes, que os imaginarão advogados plenos. Diante disso, e considerando que ainda não estarão em condições técnicas para exercer a advocacia, correrão sério risco de praticarem atos equivocados no âmbito do processo e no atendimento ao cidadão. Como consequência derradeira, a advocacia perderá em credibilidade e se fragilizará ainda mais, o que, na outra ponta, significará mais desrespeito à independência, imunidade, inviolabilidade e outras prerrogativas do advogado.
Francamente, o que a sociedade e o Poder Judiciário precisam é de advogados qualificados, que tragam aos processos pretensões bem fundamentadas, em condições, portanto, de atrair decisões mais qualificadas. O déficit social decorrente do volume de bacharéis que não passaram no exame de OAB, que a todos nós sensibiliza, há de ser resolvido por outros meios, pois a simples regulamentação dos paralegais é uma medida paliativa para um problema que começa muito antes da realização das provas da Ordem.
Uma alternativa mais eficaz seria, por exemplo, aumentar a fiscalização e criar mecanismos que contenham a expansão desenfreada do número de cursos de direito – muitos dos quais funcionam de modo precário e, na prática, tornam-se verdadeiras fábricas de diploma. O aumento do acesso ao ensino superior, iniciativa sempre louvável, deve ser acompanhado de um rigoroso controle para que o nível de aprendizagem não diminua em proporção igual ou até mesmo superior ao grande volume de bacharéis que ingressam no mercado todos os anos.
Ao regulamentar uma condição que deveria ser de exceção, o PL aprovado pela Câmara dos Deputados contribui para nivelar por baixo todo o trabalho dos profissionais de direito, na medida em que desestimula o esforço dos advogados e enfraquece um importante instrumento regulador, o que vai na contramão de esforços contrários, feitos por outras classes – como a médica – que buscam referências justamente em ferramentas como o exame da OAB para aumentarem o nível de qualidade de seus profissionais.
Espera-se, pois, que o debate sobre o tema seja estimulado, a fim de que os advogados e a própria sociedade possam se manifestar, a tempo e modo. Com a palavra o Congresso Nacional!
Publicado dia 17 de agosto/2014, no caderno Opinião do Jornal Estado de Minas, e no dia 20 de agosto de 2014 no caderno opinião do jornal Hoje em Dia.